Vida de Pesquisador: Entendendo a Estrutura Básica de um Artigo Científico
Um artigo científico é um documento escrito e que pode ser citado. Ele é feito a partir de uma observação, experimento ou hipótese que é suportado pela lógica ou resultados, que passaram por uma revisão crítica entre pares na área em que foi publicado. Ele é o principal meio de comunicação utilizado pelos pesquisadores para compartilhar seus conhecimentos e descobertas com a comunidade científica e acadêmica.
Quais os benefícios de ler artigos?
Além de permitir escrever trabalhos acadêmicos, como trabalhos de conclusão de curso (TCC), dissertações (mestrado), teses (doutorado) e outros artigos científicos, a leitura regular desses artigos nos permite:
- Expandir conhecimentos com o que há de mais recentemente descoberto pela comunidade científica e acadêmica.
- Aumentar o repertório do nosso vocabulário científico.
- Desenvolver o pensamento crítico e método científico de testagem de hipóteses.
- Acessar informações a partir de canais que costumam garantir uma maior autenticidade, uma vez que os artigos científicos são revisados por pares, o que significa que são avaliados por outros especialistas na área antes de serem aceitos para publicação em periódicos científicos. Essa revisão por pares garante a qualidade e a validade dos artigos antes de serem compartilhados com a comunidade científica.
- A leitura dos artigos permite usá-los como base para novos trabalhos que podem produzir novos achados, comparando seus resultados com os anteriores.
Como procurar por um artigo científico?
Em geral as procuras são realizadas tendo como base temas bem definidos, ano de publicação, autores envolvidos e periódico ou congresso onde foram publicados.
Alguns dos principais indexadores de artigos científicos brasileiros são:
Componentes de um artigo
Geralmente, um artigo científico segue uma estrutura padronizada, incluindo os seguintes elementos:
1. Título
- O título é o primeiro meio para chamar a atenção de potenciais leitores, e nunca devem ser genéricos. Deve ser claro, conciso e informativo, fornecendo uma ideia geral do assunto do artigo.
- Não deve ser muito longo. Isso é papel do resumo, que vem logo depois do título.
- É recomendável que você passe a observar os títulos dos artigos publicados a fim de entender como eles devem funcionar para descrever eficientemente a pesquisa.
2. Resumo
- É sempre bem curto, em geral entre 200–400 palavras. É uma espécie de trailer do filme, mas com spoilers. É usado para que, caso a pessoa não tenha tempo de ler o trabalho inteiro, possa entender do que trata o artigo. Ou seja, o resumo é uma breve síntese do artigo, destacando o objetivo da pesquisa, a metodologia utilizada, os principais resultados e as conclusões.
- Deve conquistar a atenção do leitor de forma sucinta.
- Não deve fazer citações à revisão bibliográfica. Esse é o espaço para você dizer a que veio, e o que trouxe.
- Deve apresentar o problema real e a tese (a afirmação que procura se comprovar verdadeira). A tese deve caber numa frase.
- É a última coisa que será escrita, apenas depois que todas as outras seções tiverem sido finalizadas.
3. Introdução
- Pergunta-chave: O QUE É O PROBLEMA DE PESQUISA?
- A introdução apresenta o contexto do estudo, define o problema de pesquisa e descreve a relevância e o propósito do trabalho.
- Ao final da introdução costuma haver um parágrafo resumindo o que será abordado nas próximas sessões. No nosso artigo do exemplo, o último parágrafo informa:
“O restante deste artigo está organizado como se segue. Na Seção 2, é descrito o referencial teórico com o objetivo de aprofundar sobre o ensino de ES, a metodologia ABPj e a taxonomia de Bloom; na Seção 3, listamos alguns trabalhos relacionados a este artigo, com a justificativa para a proposição da presente metodologia; na Seção 4, apresentamos o desenho da pesquisa, com os seus objetivos, o método utilizado para a elaboração da SD, assim como a definição do instrumento de coleta de dados utilizado; na Seção 5, detalhamos as etapas da aplicação da metodologia ABPj através da SD proposta; na Seção 6, analisamos e discutimos os resultados obtidos e, por fim, na Seção 7, apresentamos algumas considerações finais, assim como as intenções de trabalhos futuros.”
- Evite introduções longas. Em geral elas não ocupam mais que 10% do tamanho total do artigo.
4. Revisão da Literatura | Referencial Teórico
- Pergunta-chave: O QUE JÁ FOI FALADO SOBRE ESSE PROBLEMA?
- Nesta seção, são apresentados os trabalhos anteriores relacionados ao tema do artigo. É uma revisão da literatura existente sobre o assunto, destacando lacunas e justificando a importância do estudo atual.
- Além disso é importante tratar neste tópico questões como: Quais são as soluções atuais para o problema? Como elas atendem os “critérios de avaliação”? O que pode servir de inspiração para sua solução? No caso de problema/solução original, faz um estado da arte de delimitação do escopo (eu conheço o que existe o suficiente para dizer que ninguém fez algo igual anteriormente).
- Ao final dessa seção existe uma palavra-chave: ENTRETANTO. É necessário criar tensão, desafio, instabilidade. O conhecimento cresce na polêmica, na discussão. Existem muitos trabalhos, mas será que não existe uma inconsistência que ainda não foi discutida? Uma perspectiva que ainda não foi observada? Um contexto onde o que é conhecido ainda não foi testado? Uma exceção à regra? Esse é o fio narrativo que irá levar as seções seguintes.
- A seção de revisão de literatura costuma ocupar algo entre 10–20% do tamanho total do artigo.
5. Metodologia
- Pergunta-chave: COMO O PROBLEMA FOI RESOLVIDO?
- A seção de metodologia tem como objetivo fornecer informações suficientes para que outros pesquisadores possam reproduzir o estudo e verificar a validade dos resultados.
- A metodologia é fundamental para garantir a transparência e a replicabilidade da pesquisa. Ao fornecer detalhes precisos sobre os métodos utilizados, outros pesquisadores podem avaliar a robustez do estudo e, se necessário, realizar estudos semelhantes para confirmar ou refutar os resultados. Além disso, a clareza na descrição da metodologia permite que os leitores entendam melhor como os resultados foram obtidos e avaliem a confiabilidade dos achados.
- As informações contidas nessa seção devem abranger: i. Descrever o tipo de estudo (se foi um estudo de caso, uma revisão sistemática, etc.). ii. Revelar informações sobre os participantes do estudo, como tamanho da amostra, critérios de inclusão e exclusão, método de seleção e etc. iii. Descrever as técnicas e instrumentos utilizados para coletar os dados, como questionários, entrevistas, observações, testes, etc. Também pode incluir informações sobre o processo de recrutamento dos participantes. iv. Detalhar os passos específicos seguidos durante o estudo, incluindo quaisquer manipulações ou intervenções realizadas, sequência de eventos, cronogramas e duração do estudo. v. Descrever as técnicas estatísticas ou métodos de análise utilizados para examinar os dados coletados. Isso pode incluir testes estatísticos, análise de regressão, análise qualitativa, etc. vi. Indicar se o estudo foi conduzido de acordo com os princípios éticos e normas da área de pesquisa, como a obtenção de consentimento informado dos participantes e aprovação de comitês de ética.
- O método deve mostrar como o proponente vai fazer para que sua hipótese de trabalho seja testada e que ao final se possa concluir se ela é ou não verdadeira. Também deve deixar claro o tipo de dados que serão coletados e o tipo de análise que será feita.
- Metodologia, resultados e discussão (em especial) são as partes nobres de um artigo científico. Juntas costumam ocupar entre 40–50% do tamanho total do artigo.
6. Resultados
- Pergunta-chave: O QUE FOI DESCOBERTO?
- Devemos destacar inicialmente que os resultados e a discussão são duas seções distintas que desempenham papéis diferentes na apresentação e interpretação dos dados obtidos em um estudo.
- A seção de resultados é onde os dados brutos ou processados são apresentados de maneira objetiva e concisa. Essa seção geralmente inclui tabelas, gráficos, figuras e outros meios de visualização dos dados.
- O objetivo principal dos resultados é relatar os principais achados do estudo de forma clara e organizada, sem interpretar ou discutir significados mais amplos. É importante que os resultados sejam apresentados de forma imparcial, objetiva e baseados em evidências concretas.
7. Discussão
- Pergunta-chave: O QUE ISSO SIGNIFICA? OU COMO ISSO SE RELACIONA COM O QUE JÁ HAVIA SIDO DESCOBERTO?
- É na discussão onde os resultados são interpretados, contextualizados e comparados com estudos anteriores, abordando suas implicações. Nessa seção, os autores têm a oportunidade de analisar e explicar os resultados, destacando suas implicações e relevância para a área de estudo. A discussão envolve uma análise crítica dos resultados à luz da literatura existente, identificando semelhanças, diferenças e possíveis explicações para os achados.
- Discussão não é somente repetir dados ou fatos. É justamente usá-los para contextualizar uma explicação plausível para as coisas, ou um insight sobre algo, ou uma opinião… enfim, alguma ideia nova, inédita, autoral. É onde normalmente vem a principal contribuição de um trabalho.
8. Conclusão
- Pergunta-chave: O QUE VOCÊ TROUXE DE NOVO?
- A conclusão resume os principais pontos do estudo e apresenta as conclusões finais, destacando sua relevância e possíveis direções para pesquisas futuras.
- Apresente não apenas os pontos positivos, mas os pontos negativos do trabalho (fraquezas e limitações). Se você não for o maior crítico do seu trabalho, outra pessoa será. Além disso descreve as lições que você aprendeu no processo.
- As contribuições são apresentadas em ordem decrescente de importância: primeiro o novo conhecimento, depois as ferramentas, protótipos e etc.
- A ideia de um subtópico sobre trabalhos futuros é deixar ideias para novas oportunidades de pesquisa com as quais o autor se deparou ao longo do trabalho, mas não teve tempo ou possibilidade de seguir.
- A seção de conclusão costuma ocupar entre 5–15% do tamanho total do artigo.
9. Referências
- Pergunta-chave: QUAIS AS FONTES QUE FORAM REFERIDAS?
- As referências citadas ao longo do artigo são listadas nesta seção, seguindo um formato de citação específico (como ABNT).
- Em um artigo devemos referenciar apenas os trabalhos efetivamente citados.
- Verificar ao final se tudo aquilo que é referenciado está citado no texto.
- É importante requerer atualidade para cerca de 80% do total de referências citadas, não significando que seja inapropriado citar referências antigas, clássicas.
- As referências ficam com as últimas uma ou duas laudas do artigo científico.
Recomendações gerais na hora de escrever
- Na dúvida entre escrever muito ou pouco, escreva pouco. Entre escrever pouco ou nada, opte por nada. Melhor adicionar depois. Se em várias páginas você não conseguir dizer o essencial, é porque ainda não entendeu o que é essencial.
- Tese não é um romance policial. Você deve revelar quem matou já na introdução, o problema tem de ficar claro.
- Nunca diga: “não encontrei nada parecido com o que estou fazendo”. Sempre existe algo minimamente semelhante com o que está sendo discutido. Mostre o que outros fizeram, o que você fez, e compare. Ao dizer que não existe alguma coisa ou que não foi encontrada alguma informação, o aluno pode passar a impressão de que não pesquisou o suficiente ou que aquilo que busca é tão irrelevante que ninguém nunca se preocupou em procurar. Assim, em vez de afirmar que algo não existe, o aluno deve mostrar o que existe de mais parecido com aquilo que ele quer e então trabalhar nas diferenças entre o existente e o desejado.
- Escreva em 1a. pessoa do plural, onde nós equivale a você e seu orientador. Nunca nós equivale a você e o leitor. A utilização da 1a. pessoa deixa mais clara quando a afirmação é nossa (e precisa ser justificada) e quando é da literatura (já está justificada).
- Citação não pode ser objeto ou sujeito de frase. em [Galstyan et al. 2003]” ou “[Galstyan et al. 2003] disse”, por exemplo. Escreva que o cara disse e coloque a citação no final da frase. Se precisar ser mais explícito, escreva “A pesquisa de Galstyan [Galstyan et al. 2003] indica…”
- Em um trabalho científico, “por que” é tão importante quanto “o que”. Justifique suas escolhas, e não apenas descreva-as.
- Um artigo científico pode fazer apenas dois tipos de afirmativas: i. as que se sustentam na pesquisa desenvolvida pelos autores e; ii. as que são suportadas por referências a fontes com validade científica, em que elas estejam devidamente fundamentadas.
- Sempre que forem detectadas frases muito longas com várias orações coordenadas, deve-se procurar dividi-las em frases menores, usando pontos para isso.
- Expressões como “hoje em dia” e “atualmente” também devem ser evitadas no texto científico, porque a monografia é um trabalho atemporal. Deve-se evitar dizer que “atualmente a internet é bastante usada”. Pode-se dizer, em vez disso, que em 2009 tantos milhões de pessoas usam a internet.
- Use gráficos planos, em duas dimensões e, de preferência, em preto e branco. Leve em considerações que a maior parte das pessoas irão imprimir seu artigo sem cores.
- Destaque os termos em itálico e não negrito, pois o primeiro é mais agradável que o segundo.
- Sempre que for usar uma sigla pela primeira vez, ela deve ser definida por extenso. Por exemplo: IFRN (Instituto Federal do Rio Grande do Norte).
- Evite ao máximo o uso de palavras em inglês que tenham uma tradução direta para o português.
- Em hipótese alguma use um texto de outra pessoa sem citação ou referência. Se houver cópia literal de outros textos sem uso de aspas e citação da fonte incorre-se em plágio.
- Não seja linear. Escreva na ordem que lhe parecer mais fácil.
Referências
Um agradecimento especial ao professor Geber Ramalho, fonte de inspiração para a construção deste artigo, e quem elaborou algumas das informações aqui adicionadas.
- How to read a Research Paper? Made easy for young researchers
- Metodologia de Pesquisa para Ciência da Computação (Raul Sidnei Wazlawick)
- Manual de Produção Científica (Silvia Koller, Maria Clara Couto e Jean Von Hohendorff)